20/02/2019 às 09h42min - Atualizada em 20/02/2019 às 09h42min

Falta quase tudo, que até parece hospital da Venezuela, mas é o Regional da Capital

EDIVALDO BITENCOURT
ojacaré
A situação é caótica, que vai desde a falta de mistura na alimentação servida aos pacientes e funcionários até a falta de insumos e medicamentos para serem usados na sala de cirurgia. Desde o ano passado, a falta de remédio suspendeu até o atendimento de emergência e urgência.

A situação é tão crítica, que o leitor desavisado pode confundir com a situação da Venezuela, em situação de calamidade pública em decorrência da guerra entre o atual presidente, Nicolas Maduro, e a oposição apoiada pelos Estados Unidos.

 

Infelizmente, apesar de não receber a mesma atenção que o país vizinho, a situação é do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul Rosa Pedrossian, o segundo maior estabelecimento hospitalar do Estado.

A situação é tão crítica que foi preciso a Justiça conceder liminar para obrigar o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) a garantir o abastecimento das farmácias do hospital. O juiz José Henrique Neiva de Carvalho e Silva, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, deu 30 dias para resolver o problema mediante risco de multa diária de R$ 50 mil.

A situação é surreal, dramática e terrível para quem está internado na unidade. De acordo com o alerta do Ministério Público Estadual, a pessoa corre o risco de morrer por falta de medicamentos, pasmem, dentro do maior hospital da rede estadual.

O problema começou em abril do ano passado, quando a própria direção do HR comunicou o fechamento do Centro Obstétrico e das unidades de endoscopia e cardiologia clínica e cirúrgica por falta de medicamentos, reagentes para exames e insumos. Se alguém não tem noção, o HR é administrado pelo Governo do Estado e a administração era a mesma desde 1º de janeiro de 2015, quando Reinado assumiu o comando do Estado.

Oficialmente, o problema foi solucionado em junho do ano passado. No entanto, como parte do inquérito aberto pela promotora Daniela Cristina Guiotti, da 57ª Promotoria, o Conselho Regional de Farmácia fez vistoria in loco, em setembro do ano passado, nas farmácias do hospital e confirmou que a situação continuava igual a da Venezuela, ou seja, o estoque estava zerado ou em estado crítico para um número significativo de medicamentos.

A diretora técnica do HR no ano passado, Luzia Alves de Oliveira, confirmou que o serviço de emergência chegou a ser suspenso por falta de medicamentos e insumos. Referência na gestação de alto risco, o hospital não tinha condições de realizar o parto porque não teria remédios para recém-nascidos.

Um médico enfrentou momentos de pânico durante a cirurgia porque a resposta do enfermeiro chefe era de que os medicamentos necessários para atender o paciente na mesa de operação estavam em falta.

“Não posso aceitar essa situação de total falta de condições de trabalho dentro do centro cirúrgico. Como é possível não ter como esquentar um soro? Devemos deixar o doente fazer hipotermia o que gera distúrbio de coagulação, acidose e risco ao paciente? Solicitei ao enfermeiro chefe que resolvesse o problema de alguma forma e a resposta e que não há estufa para aquecer o soro. Devido aos transtornos de marcação de consultas ambulatoriais e demora para agendamento e realização de cirurgias eletivas não cancelamos para não prejudicar a paciente, porém essa situação de falta de materiais básicos pode ser causa de insucesso cirúrgico no futuro.Solicito encarecidamente que não faltem ao menos materiais básicos para procedimentos cirúrgicos, caso contrário teremos que cancelar novos procedimentos para não expor o paciente, os profissionais e até mesmo o hospital a risco”, relatou o profissional, como um pedido de socorro ao MPE.

No dia 11 deste mês, o Campo Grande News revelou o drama de um advogado picado por cobra, que estava fazendo hemodiálise e corria risco de vida porque faltava reagente para fazer exame.

Este caso levou a promotora a reforçar o pedido de liminar, que havia sido solicitado inicialmente no dia 17 de dezembro do ano passado.

Operação Reagente, do Gaeco, aponta desvio de R$ 3 milhões no HR, enquanto faltam medicamentos para os doentes internados (Foto: Arquivo)

Nos últimos dias, pacientes reclamaram que falta mistura na alimentação. Pacientes e funcionários são mantidos com alimentação a base de ovos, como adicional ao tradicional arroz e feijão, no almoço e na janta.

No próprio processo, a Fundação Estadual de Saúde, que administra o Hospital Regional, admitiu que o problema persiste nas farmácias da unidade. Dos 378 tipos de medicamentos, o HR está com o estoque regularizado de 75%.

Houve atraso na licitação – aquela que seria modernizado em 2015 – para 22% dos medicamentos. Ou seja, o hospital admite que ainda 83 tipos de remédios e insumos estão em falta.

Dependendo do tipo de remédio, se o paciente não tiver condições de comprá-lo, é melhor ele adiar a doença, porque o Governo do Estado não tem condições de lhe dar o tratamento considerado ideal e eficiente.

Os problemas se arrastam desde abril do ano passado e perduraram durante toda a campanha eleitoral. Reeleito, Reinaldo ainda não conseguiu resolver.

Só para complicar a situação, nos últimos 12 meses, o HR foi alvo de duas operações de combate à corrupção. No dia 25 de janeiro do ano passado, a Polícia Federal deflagrou a Operação Again e prendeu um médico cardiologista acusado de fraude e desvio de dinheiro no setor de cardiologia.

Em novembro, o Gaeco prendeu três pessoas e apontou desvio de R$ 3 milhões na Operação Reagente. A Justiça bloqueou mais de R$ 11 milhões dos envolvidos no suposto esquema criminoso.

É mais um caso claro e objetivo dos efeitos da corrupção na saúde pública. Enquanto criminosos se locupletam, pacientes até morrem por falta de materiais, remédios, insumos, médicos, vagas. É o Brasil, não a Venezuela!

Sobre a liminar determinando a reposição dos estoques nas farmácias do HRMS, a Secretaria Estadual de Saúde informou que ainda não foi notificada.

O Governo mudou o comando do HR. Márcio Eduardo de Souza Pereira, funcionária de carreira da instituição há 17 anos, substituiu o médico Justiniano Vavas no início deste ano. A troca é um sinal de que a situação pode melhorar no segundo mandato do governador Reinaldo Azambuja.


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